quinta-feira, 27 de março de 2014

A certeza faz as pessoas marcharem e me dá medo

     Não quero julgar ninguém. Julgar é uma tarefa difícil e não quero fazê-la. Mas três pessoas me fizeram pensar muito essa semana: Paulo, ex-assassino de cristãos. Hitler, assassino de judeus, homossexuais, negros... E Paulo Malhães, coronel reformado do Exército Brasileiro e assassino de subversivos. Eles me fizeram perder o sono, algo que já é de praxe e só precisa de um ponta pé, pensando no benefício da dúvida.
     Não gosto das cartas de Paulo às primeiras comunidade cristãs. Elas me parecem distintas da liberdade espiritual que as biografias de Jesus narram. Então prefiro as quatro biografias do Messias cristão às epístolas paulinas. Todavia parece-me que dos três personagens citados acima apenas Paulo se permitiu o benefício da dúvida, parando de matar cristãos e agregrando-se à eles. Hitler, não assimilando que poderia estar errado em suas convicções tirou a própria vida, segundo consta nos livros de História e Paulo Malhães ainda hoje não se permite tal epifania e afirma que matar e torturar pessoas de "alta periculosidade" pode ser uma política de Estado.
     Tenho medo de encontrar pessoas como o Paulo, o coronel, neste século. Existindo pessoas como ele não temos grandes perspectivas sustentáveis. Não pretendo que todos pensem como eu. Mas gostaria muito que todos se permitissem o benefício da dúvida. A dúvida me dá a firme e contundente visão de que a minha certeza é apenas uma dentre tantas outras, e que ela é só minha. A dúvida de que poderiam existir religiões e deuses além dos de Israel, teriam evitado a morte de milhares de cristãos. A dúvida de que ciganos, negros, gays, judeus... não eram inferiores aos alemães, teria evitado a morte de aproximadamente 11 milhões de pessoas pertencentes a essas minorias, sem contar o número de mortos nos campos de batalhas da Segunda Guerra. 
     A dúvida poderia evitar que um homem de alta patente das Forças Armadas desse país continuasse pensando que torturar e matar pessoas que pensam diferente seja algo corriqueiro. Tempos difíceis! Tempos nos quais ainda marcham enquanto família, com deus e pela liberdade. Então me pergunto: que tipo de família? Que deus? Que espécie de liberdade?
     Olha, já fui católico, protestante, maçom, petista... Já estive em muitos lugares. Quando me permiti duvidar fui ficando vazio de muitos daqueles lugares. Percebi que quando minhas certezas se tornaram a certeza, eu acabei sendo menos gente. Menos humano. Passei a ter coragem de duvidar. Sim, para duvidar temos que ter coragem, afinal a certeza é um lugar quente e confortável. 
     Pergunto-me: e se eles tivessem se permitido o benefício da dúvida? E se a coragem não tivesse sido tardia em Paulo de Tarso? E se Hitler tivesse se sentado à mesa com um judeu para jantar e bater papo? E se Malhães se desse à dignidade do sentimentalismo e tivesse em algum momento daquela ditadura duvidado do que estava fazendo? Talvez três agonias tivessem sido evitadas. Talvez várias verdades se abraçassem. 
     Tenho medo de pessoas que não duvidam. Tenho medo de certezas absolutas, elas costumam acender fogueiras.


http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/videos/t/edicoes/v/coronel-reformado-confessa-ter-torturado-e-assassinado-presos-politicos-durante-a-ditadura/3239079/
                                                                                                RJ

segunda-feira, 17 de março de 2014

As pessoas continuam jogando papel no chão

     Sim, faz tempo que não escrevo neste pedaço de tela. Pelo menos aqui no blog. Tenho me dedicado aos contos e ao romance que talvez nunca saiam. Mas hoje decidi escrever aqui. Decidi escrever sobre meu cansaço. Fiquem tranquilos. Não é um desabafo. É apenas a ludicidade teimando mais uma vez em mim.
     O Brasil foi tomado por um turbilhão de acontecimentos, é verdade, todavia existe uma desinformação precedida de # (que só há alguns dias descobri o que significa graças a um amigo) me cansando. 
     Respeito a todos e às suas opiniões, mas me cansa a Raquel Sherazade com sua contundência de senso comum. Sim, o senso comum dela é um entojo. Cansa-me o joguinho tosco entre tucanos e lulistas. Sabem, estou cansado de manifestações, que em junho de 2013 me deixaram esperançoso. Um clássico entre Cruzeiro e Atlético reúne gente da mesma maneira. 
     Estou cansado do Beijinho no Ombro e do Lepo Lepo, não enquanto manifestação cultural de umas gentes, mas como um hino matutino. Já estou até cansado desse ano eleitoral. Acreditam que, como fui ativista político, já estão chegando emails e telefonemas de candidatos que nem conhecem as cartilhas de seus partidos? Cansa-me demais ver o Estado policialesco e a Sociedade Civil se degladeando. E essa nossa mídia? Maniqueísta e bipolar. Nossa! Como ela me cansa. 
     E assim vamos nós, alguns entram em um jogo qualquer dessa desinteligência toda. Outros nem sabem o que acontece. E ainda há os que se cansam. Culpados? Inocentes? Nada! O ser humano no máximo pode ser incoerente. Somos múltiplos, não é? Quero esse adjetivo para me justificar: sou múltiplo. 
     Desejo apenas que no meio de nossas incoerências nos encontremos e façamos algo pelo nosso canto de universo. Que apoiemos a contundência de Sherazade, ou não. Que saibamos votar em tucanos ou lulistas, ou mesmo que participemos de uma passeata qualquer cônscios daquilo que queremos, mesmo que seja a vitória de um time de futebol. Desejo que o Lepo Lepo não seja a música que me desperte para trabalhar e que os políticos parem de me ligar. Desejo que o Estado e a Sociedade Civil se sentem à mesma mesa e que a mídia não tente manipular, pelo menos a mim. Isso me irrita!  Desejo que todos se encontrem, dentro ou fora do jogo. Talvez até em um blog, apenas observando, de cansados que estão.
     Percebem como ainda, apesar de cansado, resta uma frágil esperança neste que aqui escreve? Frágil mesmo, porque com esse caldo engrossando de (des)informação e com toda a nossa incoerência humana para assimilar tudo isso as pessoas ainda jogam papel no chão. Ver as pessoas jogando lixo no chão: isso me cansa.

                                                                                                             RJ